TCHAU VELADO


Nos últimos tempos me incomodava escutar de algumas amigas a afirmação de que homens pedem telefone, para não ligar. Isso me intrigava, mas como não tinha uma boa resposta, ficava quieto. Algumas vezes, pegava-me pensando se a menina tivesse te passado o telefone é óbvio que ela estava interessada que você ligasse. Espera; eu sei que algumas passam números errados, mas são poucas e quando passam nunca vão saber se realmente ligamos ou não.

A boa resposta veio em uma semana despretensiosa. Estava a caminho de um rodeio, lá ficaríamos no camarote para assistir um show de axé. Comigo estava uma prima, sua amiga e um amigo. Conhecemos o ambiente, começamos a tomar nossa cerveja e a conversar. As meninas vão dar uma volta. Eu e Mike aguardamos na mesa assistindo ao rodeio, tomando cerveja e falando amenidades.

As meninas voltam e nós saímos, nossa vez de ir além do camarote. Quando voltamos o camarote estava mais cheio, mas longe de ficar lotado. Encontramos as meninas conversando com uns caras bonitões. Neste momento meu amigo insiste para irmos aos pisos superiores do camarote. Eu realmente queria interromper o papo que o cara estava passando na minha prima, mas subi para os outros pisos do camarote.  No segundo andar encanto-me com uma moça muito bonita.

Acerto o passo, encho o peito me aprumo para ser percebido pelo grupo em que ela está. Tomando minha cerveja ao lado de sua mesa e assistindo ao rodeio espero pacientemente, lanço-lhe alguns olhares discretos. Percebo que sou visto. Meu amigo está ao meu lado todo esse tempo me dando apoio moral, mas a demora começa a me agoniar, me sinto pressionado, Mike ironiza minha tática e me incentiva a tomar uma iniciativa.

Surge um cara ao lado dela. Perdi minhas chances. Paciência. Ela algumas vezes podem ser vistas como medo, demora e perda de uma boa oportunidade. Mas não foi. O cara sai, ela conversa com suas amigas me olha algumas vezes, vejo que tenho que sair dali ou encara - lá. Encaro, não posso decepcionar meu amigo, muito menos a mim. Deixo Mike de lado, estou inseguro, não quero tomar um fora na frente dele. Lidar com fora solitário é fácil, porém um compartilhado não é bom.

Chego com o papo mais furado que existe, nome, onde mora, tipo de música, em que trabalha e coisas do tipo. Ficamos nesse papo um bom tempo, fico sem saber o que falar, mas ainda achava que não era a hora de beijar. Começa a apresentação da banda as amigas dela seguem para a arena e eu a faço companhia. Estamos a “sós”, bom sinal. Mais um pouco de papo e enfim tomo a iniciativa. Deu certo, correspondeu. Ficamos mais um tempo conversando. Até este momento só bebi, estava com a bexiga cheia, mas como tinha ficado recentemente com ela é complicado sair e perder todo o papo já jogado, além de ir ao banheiro, ser um sinal de tchau velado.

Ela foi ao banheiro, deixou o celular dela e das amigas comigo. Isso me alivia, não vai ser um beijo e nada mais. Espero-a. Ela retorna falo que preciso ir ao banheiro, pegar uma bebida e falar para minha prima onde ela pode me encontrar. Meu amigo nessas horas tinha sumido, vim, a saber, depois que estava na arena.

Eu aliviado, minha prima informada, passo no bar pego minha bebida e vou ao encontro da moça. Ela esta sozinha assistindo ao rodeio, dançando. Penso como abordarei ela. Resolvo de uma forma discreta nada muito agressivo ou sacana, de qualquer forma, beijando-a.

Ela me recebe bem, a gente se abraça e ela comenta que não esperava me rever. A gente continuou junto à noite inteira, cada vez me abria mais para ela e a recíproca era verdadeira. Estava tão bom, não podia acreditar. Ela beijava bem e a gente que tinha começado travado, duro nos abraços e carinhos começamos a relaxar e se entregar. Estava no céu, para falar a verdade estava tão entretido que do show não lembro nada. Nosso papo estava cada vez mais sincero e começamos a nos contradizer em algumas coisas pelas nossas atitudes. Ela não deixava passar nada. Adorei quando ela comentou que eu não era roqueiro e sim fã de Axé. Observação pertinente e cômica, pois estava pulando, dançando e curtindo. Porém o melhor mesmo era ela estar prestando atenção em mim. Ela não errou, sou micareteiro, porém, também gosto de rock, forró e MPB.

O show acabou, minha prima e sua amiga nos encontraram, as amigas dela retornaram e meu amigo me informou que nos esperava no carro. O fim era fatídico, peguei seu telefone ela foi embora e eu procurar minha prima que tinha ido dar a sua última volta.

Encontrei minha prima e fomos ao carro. No carro, Mike irritado com o rodeio. Iniciamos nossa jornada de volta para casa. Nesse meio caminho recebo uma mensagem dela dizendo que tinha adorado me conhecer. Minha moral se elevou, se tudo já estava bom, apenas melhorou. Dia seguinte enviei uma mensagem para ela respondendo-a.

Na semana seguinte na quinta-feira consigo alguns vips e convido-a para me acompanhar. Ela não me respondeu na hora. Um tempo depois retornou a ligação dizendo que não teria como ela ir de carro e coisa e tal. Como a convidei, me dispus a levá-la. Nós éramos de cidades diferentes e o rodeio era em outra, porém nossas cidades não eram longe uma da outra, além disso, é cortês e cavalheiresco de quem convida ir buscar. Mesmo assim ela negou e disse-me que iria no domingo num bar na cidade em que eu morava. Não foi de todo perdido.

No sábado na véspera do encontro envio uma mensagem para ela, ela não me responde. Domingo telefono para ela algumas vezes e deixo recado na secretária. Nada. Dia seguinte encontro ela no Orkut, tento lhe falar, ela desliga. Humm. Tinha acabado de escrever um depoimento para ela, queria ouvir alguma desculpa, do tipo: meu celular foi roubado.  Percebo um pouco tarde que o banheiro não havia sido o tchau velado, mas esse foi. Hoje falo para minhas amigas: “vocês nos passam o número do telefone esperando que não liguemos”.

Publicado anteriormente em https://www.recantodasletras.com.br/cronicas/4681904

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