QUAL “TRIBO”? (Teatro Escolar)

QUAL "TRIBO"?*


Quadro 1

(Uma sala de aula com o professor fazendo a chamada pelos números dos alunos. Todos os alunos conversando).

Prof. – Número 42.
(Pausa)
Nº 42 Eu?
Prof.Número 42.
(O aluno olha para o professor)
Prof.Número 42. Presta atenção estava colocando falta para você.
Nº 42Que é isso, psor? Eu respondi!

Quadro 2
(Uma aluna levanta da carteira, aproxima-se do professor e apresenta uma folha. Ele olha a folha e depois para a menina, coloca ciência e acrescenta mais uma aluna no diário).

Prof.Oi. Aluna nova?
Nº 43Sim meu nome é Zuleica da Silva
Prof. – Número 43. (A menina olha sem entender, mas vira e volta para a sua cadeira).

Quadro 3
(Intervalo. A aluna nova está perdida, entra na fila da merenda. Alguns alunos furam fila e ela sozinha fica a observar, descontente).


(Ela consegue pegar sua merenda, segue em direção a uma mesa, senta e come o arroz 
com salsicha, não muito rápido, mas com fome).


(Deixa o prato de comida e a colher no lugar certo e segue em direção ao banheiro).

(O inspetor a chama).



InspetorZuleica venha conhecer a Sá, a Bá e o Jé.

(Ela estranha aquelas pessoas).


Zu – Oi, sou a Zu.

– Sou a Sá.

Sou a Ba.
Sou o Jé.

(Inspetor sai de cena)


– Da onde você vem?

Zu – De cima.

Háaa só podia ser mais uma nordestina... ainda mais vestida assim, toda brega.
ZuEu to de uniforme, me falaram que era obrigado vir assim.
Deveria, mas não é assim que funciona.
ZuComo é que funciona?
Cada um vem do jeito que gosta.
ZuMas vocês não acham que é muito quente ficar de preto nesse calor?
Claro que não, é nosso estilo, a gente gosta de algo pesadão, um rock melódico, gótico, punk ou mesmo Sepultura.
Zu Sepultura não é onde enterram os mortos?
É, mas é o nome de uma banda de rock braseira bem pesada e das mais conhecidas, você nunca ouviu falar dos irmãos Cavaleira, o Igor ou o Max?
ZuNão!
Que tipo de música que você gosta?
Zu De umas lá da minha terra, mas é diferente da que está tocando agora.

(Estava tocando Rock/pop Nacional – Charlie Brown Jr.).

Essa música não tem nada haver...
É... música de skatista... e daqui a pouco vai piorar. Vai tocar Hip Hop.
Eca... Nem me lembre...
ZuO que é isso?
Música de mano.
ZuMano?
Da onde você é? De Marte?
hahahaha.
hahahaha.
Zu Não, mas as músicas da minha terra são diferentes, e eu achei essa legal.

(Os roqueiros saem rindo da cara dela).



Quadro 4
(Esta tocando Rap. Tem um grupo de alunos dançando break. Zu se aproxima de um grupo de pessoas que começam a circundar os dançarinos).

ZuNossa... que legal... como eles fazem essas acrobacias.
JãoNão é acrobacia, é dança. È o break.
ZuLegal isso... Tem haver com o Hip Hop?
JãoLógico! O break e um tipo de dança do movimento que se chama Hip Hop. Eles dançam uma poesia rítmica, que se chama Rap. E você esta vendo aquele cara?
Zu – Sim. O que ele está fazendo?
JãoEle está grafitando. O grafite é uma forma de fazer arte dentro do Movimento Hip Hop.
ZuNossa... que legal... bem complexo.
JãoUm pouco. Você nunca escutou D2 ou Racionais?
ZuNão! Acho que não?
JãoAcha... você veio de outro mundo? Onde você morava não tocava hip hop?
ZuNão!
JãoTocava o que então, música de Playba?
Zu Música de Playba?
Jãoahhh... Pop, Tecno, Dance, Capital Inicial, Skank... essas coisas...
(A música tinha acabado e a roda estava se desfazendo).
Zu – Acho que não...
Jão – Deixa para lá... (Vira as costas para ela e sai de cena)



Quadro 5

(Música de tecno tocando. Algumas pessoas dançando paradas em seu lugar. Ela se aproxima de um grupo de meninas da sala dela).

Zu Número 19, essas músicas... 
Nº 19Eu tenho nome sua besta...
ZuDesculpa, eu achei que para os colegas de sala a gente se chamava pelo número, que nem o professor fez.
(Nº 19, ri indignada).
Nº 19Nada haver, aquele é seu número de chamada.
ZuMas... eu também tenho nome, como você, e por que ele não me chamou pelo nome?
Nº 19 Sei lá, todos os professores nos chamam por número, por que você não pergunta pra eles?

(Começou o batidão – funk. Nº 19, torce o nariz).


Zu – Que música é essa? Parece Hip Hop?

Nº 19 – Você não está vendo aquelas galinhas?

Zu Galinhas? Onde?
N° 19 São aquelas meninas rebolando.
Zu Ahhh sei...
Nº 19Elas são as mais assanhadas da escola...
ZuAssanhadas?
Nº 19Você é burra???
(E ela sai de cena).



Quadro 6
(Zu se aproxima de uma menina que estava dançando funk)

ZuOi, eu sou a Zu e você?
Le Sou a Le, você é a aluna nova?
ZuSou.
LeCuidado em andar com aquelas Patis. Elas são muito nojentas, metidas.
ZuPatis?
LeAquela menina que você estava conversando.
ZuAhh sei, as Playba... 
LeÉ... 
ZuPor que vocês dançam assim?
LeA gente gosta, tem gente que dança parado, juntinho, a gente dança assim.
ZuVocês não tem vergonha de mexer o bumbum!
LeVocê acha que eu sou que nem suas amigas... aquelas Patis assanhadas...

(Le sai de Cena).

Quadro 7
(Começa a tocar Rio Negro e Solimões. Zu caminha até a porta do banheiro. Lá tem umas pessoas com bota e chapéu fazendo um outro tipo de dança). 

ZuLicença.
Pois não, Moça.
ZuObrigada.
(Os companheiros do Zé a barram e ela olham para eles).
ZuHum, porque você anda com esse chapéu.
Toninho – Oh moça, eu uso pra trabalha e esse uso para sair de casa.
ZuÉ... legal. É diferente de tudo que já vi hoje.
A maioria do pessoal aqui não gosta de Sertanejo, eles preferem músicas mais urbanas.
Toninho – É... nois gosta dessa que está tocando, você gosta?
Zu Eu não conhecia, gostei, fala de amor.
É... fala de amor.
Zu É engraçado existe um monte de jeito de falar de amor, uma forma Sertaneja, tecno, dance, rock/pop nacional, rock melódico, Funk e Rap, e cada um dos grupos se veste, dançam e agem de um jeito que tem que ser diferente do outro...
Toninho – É moça... O Zé, nosso amigo, te achou muito bonita.
ZuObrigada. (Olha para o Zé e segue ao banheiro).


Quadro 8

(Zu chega ao banheiro. Está sozinha. Olha no espelho).

Zu – Nossa... que mundo mais complicado...

"Um monte de gente parecida fisicamente, mas diferente em modo de se expressar, cor de pele, altura, largura e mais um monte de coisa”. (Ela olha para o céu). “Pai... a beleza dessas pessoas é estampada na cara, mas não entendo como elas podem não se entender. Essa falta de afinidade pelos diversos estilos de vida, essa intolerância, inveja. São tão mínimas as diferenças nos grupo em que eles se identificam, espelham-se e ao mesmo tempo, negam uns aos outros para apenas tentar acreditar e fortalecer a escolha do seu grupo... É uma coisa tão estranha...


Deus/AláFilha, eles brigão até por diferenças na compreensão da minha revelação. Uns acreditam assim, outros assado... uns falam que me amam mais que os outros. Como podem os meus filhos tentar encontrar uma intensidade para o amor, muito menos graduá-la, pois ela é única... é crença, amor, sonho... fé.

Deus/AláCalma minha filha, compreendo sua aflição.

ZuObrigado Pai, só você para compreender essas desavenças. Anjo nenhum poderia entender sem você nos explicar.




FIM
* Essa peça eu escrevi a muitos anos atrás e está publicada no site Recanto das Letras, assim como todos os meus contos e poesias que tive coragem de publicar. Se alguém apresentar essa peça gostaria que me enviasse um vídeo ou me chamasse para assistir. Não cobraria direitos autorais, a única coisa que gostaria é que fosse apontado a minha autoria, se foi adaptado, mencionar de quem foi adaptado a peça. Para mim ver materializado por outras pessoas é sempre gratificante, pois a peça sai do papel e tem vida.


OBS: Só lembrem-se. se forem fazer uso dessas palavras em outro local façam as devidas indicações autorais:
ANTONIETTO, DANIEL LORIM. https://profdanielantonietto.blogspot.com.br/2018/02/qual-tribo-teatro-escolar.html

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