O PETRÓLEO NO BRASIL

Esta é a segunda parte das postagens sobre o Petróleo. Nesta parte vocês verão como surgiu o petróleo no Brasil e a relação com a importância do petróleo no mundo.


TESOURO MAL CHEIROSO
Daniel Rebouças 

Para perfurar o primeiro poço de petróleo do país, os exploradores lutaram principalmente contra a burocracia 

Em plena manhã de sábado, os baianos acordaram com as manchetes dos jornais anunciando: “Jorrou! Petróleo em Lobato!” O acontecimento pôs fim a uma grande expectativa que havia mobilizado o país, pois naquele janeiro de 1939 foi descoberto o petróleo nacional. 

O fato ganhou ainda mais importância porque estava para começar outra guerra mundial, com grande risco de haver racionamento de combustível. As explorações haviam começado em 1931, quando o comerciante Oscar Cordeiro (1989-1970) e o engenheiro Manoel Inácio Bastos (1891-1940) foram averiguar notícias sobre um óleo malcheiroso em Lobato, na época um bairro afastado e pouco povoado de Salvador. Acreditando tratar-se de petróleo, não mediram esforços para perfurar um poço no local. Era o início da história do “óleo negro” na Bahia. Essas primeiras tentativas eram de caráter privado, com pouquíssimos recursos tecnológicos, bem diferentes da atual exploração do pré-sal, que conta com imenso aparato tecnológico e financeiro, com participação de capital privado e estatal. 

Mas a busca pelo petróleo data de meados do século XIX, quando se procurava o carvão mineral, a principal fonte de calor que movia navios, trens e máquinas a vapor, símbolos da Revolução Industrial. Na Europa – e mais tarde também no Brasil –, o carvão fornecia o gás para os novos sistemas de iluminação. Com suas imensas jazidas, a Inglaterra detinha o controle do seu comércio mundial, mas também explorava o mundo em busca de outras reservas, como o petróleo. 

Na Bahia, os primeiros indícios deste óleo foram encontrados nas explorações de carvão. As atividades mais antigas ocorreram em 1852, numa empreitada envolvendo o presidente da província, João Maurício Wanderley (1815-1889), comerciantes ingleses e baianos. Após dois anos de trabalho, as amostras foram enviadas ao Museu Nacional, no Rio de Janeiro, que tinha entre suas funções avaliar todas as possíveis descobertas mineralógicas do país, indicando sua natureza geológica. Sobre a empreitada, o diretor do Museu, Frederico Leopoldo Burlamaqui, comentou na ocasião: “É admirável a impávida certesa que nutrem os empresários d´encontrar huma mina de carvão de pedra no lugar onde acharão o petróleo.” 

Para a infelicidade dos exploradores e patrocinadores, não se tratava de carvão de pedra. As análises indicavam uma variedade de minerais combustíveis, entre os quais o petróleo. Com resultados negativos, a empreitada foi abandonada em 1859. Havia outros exploradores que também procuravam minerais na região, mas deixavam para trás suas aventuras por causa de resultados semelhantes. Ao que tudo indica, as informações acumuladas nesse primeiro momento influenciaram os descobridores de Lobato mais tarde. 

A importância do petróleo como combustível ainda era pequena. No início do século XIX, mineiros nos Estados Unidos reclamavam que os poços de extração de sal estavam impregnados de um óleo malcheiroso que era utilizado basicamente para iluminação. Mais tarde, as explorações do coronel norte-americano Edwin Drake em 1859, na cidade de Tutisville, na Pensilvânia, representaram um importante marco na história do petróleo. 

A partir do início do século XX, o petróleo se tornou o principal combustível da economia no mundo, superando o carvão mineral. Logo seus derivados foram usados para a expansão de uma invenção fundamental: os motores de explosão interna. Na Primeira Guerra Mundial (1914-1918), a utilização dos primeiros aviões e carros movidos a derivados de petróleo em combate influenciou de alguma maneira no resultado a favor dos Aliados (EUA, Inglaterra e França). Além disso, o conflito provocou pela primeira vez o risco, em escala mundial, da escassez de petróleo, conscientizando governos e parte da sociedade sobre a importância de os países terem suas próprias reservas. 

Mesmo depois da guerra, ao longo da década de 1920, a corrida internacional pelo petróleo se intensificou. No Brasil, o controle do fornecimento dos derivados estava com empresas como Esso, Texaco e Shell. Quando chegaram aqui, estavam interessadas em ampliar sua presença na descoberta de novas reservas. 

Mas técnicos e deputados nacionalistas começaram a cobrar uma postura radical contra a presença de empresas estrangeiras no setor, em 1921, exigindo que o petróleo fosse tratado como uma questão nacional. A preocupação central era a dependência brasileira no fornecimento de combustíveis. Segundo os políticos, a legislação abria muito espaço para empresas privadas, nacionais ou estrangeiras, explorarem todo o setor. Por isso o Estado deveria garantir o controle daquela riqueza mineral. 

O ministro da Agricultura, Ildefonso Simões Lopes (1866-1843), tomou partido na questão, participando da criação da Lei de Minas de 1921, que relativizava o poder privado sobre a exploração do petróleo. Em 1926, ele ainda trabalhou na revisão constitucional que colocou o setor petrolífero como item de segurança nacional, intransferível para estrangeiros. “Pela sua alta importância mundial, essa espécie de jazida requeria uma legislação especial. É chegado o momento de realizá-la com maior atenção”, declarou à época. 

Na mesma ocasião, o órgão oficial responsável por pesquisas geológicas, o Serviço Geológico e Mineralógico do Brasil (SGMB), organizou um levantamento das potencialidades petrolíferas do país, especialmente no Sul e no Nordeste. Mas os resultados iniciais não foram muito animadores quanto à existência de reservas imediatas. Os técnicos insistiam em pesquisas na Bacia de Maraú, situada na Baía de Todos os Santos, e os estudos foram paralisados por falta de recursos. 

A ideia de controlar o petróleo nacional predominou nos anos 1930, no primeiro governo de Getulio Vargas (1930-1937), de forma mais nacionalista e restritiva do produto. O Código de Minas, de 1934, determinava que somente empresas com acionistas brasileiros poderiam explorar o setor. Além disso, foi criado um novo órgão, o Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), responsável pela execução dos planos do governo para identificar novas reservas. Essa condução nacionalista se radicalizou após o golpe do Estado Novo (1937-1945), com a criação, em 1938, do Conselho Nacional de Petróleo. O órgão refletia a nova percepção do governo sobre o petróleo. 

No entanto, as principais controvérsias sobre o petróleo brasileiro não vieram dos arranjos oficiais. Em Alagoas e São Paulo, o escritor e empresário Monteiro Lobato, envolvido com explorações particulares de petróleo, trazia a público outro debate: a descoberta de imensas reservas e a busca de apoio técnico junto ao governo federal. Mas, diante da postura defensiva do DNPM, partiu para graves acusações a Vargas, denunciando supostos interesses internacionais. 

Na Bahia, as polêmicas estavam centradas no petróleo do bairro de Lobato. O engenheiro Manoel Inácio Bastos e o empreendedor Oscar Cordeiro registraram, juntos, a mina em cartório e criaram uma sociedade. Entusiasmados, solicitaram ao governo uma sonda e um técnico para auxiliar nos trabalhos, e enviaram suas amostras para uma análise oficial. Além de recusar o pedido, o DNPM solicitou novas amostras in natura, pois o material enviado parecia já ter sido manipulado. 

A discussão ficou tensa, com acusações cada vez mais graves de incompetência e favorecimento a interesses estrangeiros. O órgão oficial se defendia afirmando que se baseava em critérios puramente técnicos: as amostras não indicavam as condições geológicas de petróleo no local. No final de 1934, enquanto Manoel Inácio Bastos se afastava para se dedicar a outras pesquisas, Oscar Cordeiro continuou sua luta na imprensa. As atenções sobre a Bahia iam crescendo, uma vez que as reservas de Monteiro Lobato não se confirmaram. E em 1936, renomados geólogos questionavam publicamente a interpretação oficial. 

Diante da pressão, o DNPM deslocou uma sonda em agosto de 1937, perfurando o poço n° 153 em Lobato. No ano seguinte, Oscar Cordeiro trouxe, com a ajuda do governador, uma sonda mais potente. Finalmente, em janeiro de 1939, o petróleo jorrou na Bahia, diminuindo a ansiedade em relação à produção nacional. O primeiro campo descoberto no Brasil, mesmo economicamente inviável – a produção média em Lobato e em suas imediações estava abaixo do esperado –, abriu perspectivas sobre a existência de imensas jazidas em locais próximos. Pouco tempo depois, em 1941, na região de Candeias, eram perfurados, finalmente, os primeiros poços em escala comercial do país. 

Desse modo, a riqueza do subsolo afastou parcialmente o Brasil dos males da guerra. Mas ninguém poderia imaginar que, meio século depois, petróleo e guerra se tornariam palavras quase sinônimas. 

Daniel Rebouçasé coautor de História do Petróleo na Bahia (EPP, 2010). 


Bibliografia 

COHN, Gabriel. Petróleo e nacionalismo. São Paulo: Difel, 1968. 
DIAS, José Luciano de Matos; QUAGLINO, Maria Ana. A questão do petróleo no Brasil: uma história da Petrobras. Rio de Janeiro: CPDOC, 1993. 
MOURA, Pedro de. Em busca do petróleo brasileiro. Ouro Preto: Fundação Gorceix, 1976. 

Fonte:
http://revistadehistoria.com.br/secao/artigos-revista/tesouro-malcheiroso

01 - Trailler do Filme Sangue Negro.


02 - Campanha o Petróleo Tem Que Ser Nosso. 
Contra a onda de privatizações do decênio de 1990.

03 - Como se forma o Petróleo?


Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

TINTIM, O IMPERIALISMO E A EUGENIA

DESENHO SOBRE DIVERSIDADE ÉTNICA

HISTÓRIA E FICÇÃO: IDADE MÉDIA E O FILME “ROBIN HOOD O PRINCIPE DOS LADRÕES”