A DIVULGAÇÃO DO FUTEBOL NA ERA PELÉ, GARRINCHA E ZICO. (1937-1980)


Postagem especial sobre FUTEBOL. Atendendo a pedidos segue a baixo um artigo sobre o Futebol, o Canal 100 que era uma empresa que produzia as notícias antes de passar um filme na sala de cinema, pois TV não era muito popular até a década de 1980. Divulgava os melhores lances do futebol brasileiro, além de outras notícias dos Governos Vargas ao Militar no intervalo entre o início da sessão e o do filme.

“Que bonito é...”

Graças ao Canal 100, ir ao cinema significava ver imagens emocionantes do futebol brasileiro
CANAL 100 - INVASÃO DE 1976.

O jornal cinematográfico, que no Brasil surgiu em 1912, já em 1935 atingia a marca dos cinqüenta. E durante o Es­tado Novo (1937-1945) esses informa­tivos ganharam ainda mais força com a obrigatorie­dade de sua exibição, além do lançamento do pri­meiro realmente oficial, o Cinejornal Brasileiro, pro­duzido a partir de 1937 pelo Departamento Na­cional de Propaganda (DNP) e que se tornou instru­mento de propaganda do presidente Getúlio Vargas. Nas telas, preferencialmente, dois temas: o "ritual do poder" e o "berço esplêndido"; o primeiro, uma re­ferência às filmagens de eventos políticos, paradas militares e inaugurações; e o segundo, uma exaltação ao Brasil maravilha e suas belezas naturais.
Ao final da década de 1950, no governo JK, no­vos cinejornais despontaram para divulgar a cons­trução de Brasília. O Canal 100 era um deles, só que conseguiu a proeza de se manter nas telas de 1959 a 1986, enquanto os demais desapareceram. E um dos segredos de seu sucesso era a técnica aliada a uma linguagem poética, expressiva, combinando som e imagem de forma nunca antes vista no Bra­sil. Seu produtor e proprietário, Carlos Niemeyer, ou Carlinhos, como era conhecido, tornou-se um dos personagens mais famosos da noite carioca ao fundar, com um grupo de amigos boêmios, o Clube dos Cafajestes, responsável por boa parte da agita­ção cultural na cidade. Piloto da Força Aérea Brasi­leira, sua vida deu uma grande virada ao largar a FAB e se dedicar à mesma carreira no setor priva­do, quando então conheceu Jean Mazon, francês que havia conquistado prestígio na Europa ao rea­lizar ensaios fotográficos com políticos como Beni­to Mussolini e Adolf Hitler, e que veio para o Brasil na década de 1930.
Aqui, depois de ter trabalhado no Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP) e na revista O Cruzeiro, Jean Mazon passou a produzir seus pró­prios documentários, transportando para as telas o Brasil alegre, festivo, e suas belezas, como expressão de ufanismo. Depois de voar pelos mais diferentes recantos do país e fazer alguns documentários com Jean Mazon, Carlinhos comprou o espólio da em­presa Líder Cinematográfica e entrou firme na pro­dução de cinejornal, que já na década de 1950 co­meçava a enfrentar a crescente presença da TV.
A produção de Niemeyer foi bem variada. Entre 1962 e 1964, realizou o documentário Os sem terra, sobre a reforma agrária, a pedido do governador do Rio Grande do Sul, Leonel Brizola (1922-2004), ao mesmo tempo que filmes de conteúdo conserva­dor, como o patronal A boa empresa, e Asas da de­mocracia, uma apologia à FAB, ambos encomenda­dos pelo Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais. O IPES foi uma organização de empresários do Rio e de São Paulo, fundada em 1961, que desenvolveu intensa propaganda anticomunista e fez dura opo­sição ao governo João Goulart (1961-1964), tor­nando-se grande incentivadora do golpe de 1964. Esses filmes tinham o intuito de cultuar os valores capitalistas, católicos e militares, e contavam com a direção de Niemeyer, além da narração de Cid Moreira, que se tornaria clássica nas edições do Canal 100.
Outro fator para permanência do Canal 100 no ar durante tanto tempo foi a forte relação com os governos militares pós-64, que patrocinavam o ci­nejornal através do Banco do Brasil e da Caixa Eco­nômica Federal. O regime militar sabia da repulsa popular às formas tradicionais de divulgação gover­namental, e criou em 1968, no governo do presi­dente Costa e Silva, a Assessoria Especial de Rela­ções Públicas (AERP), órgão ligado à Presidência, responsável pela propaganda. A princípio esse ór­gão não teve grande importância, mas com a entra­da do coronel Octávio Pereira da Costa, já no gover­no Médici, tudo mudou. A estratégia da AERP no período (1969-1974) foi elaborar um discurso indi­reto através de filmes curtos para a TV - exaltando A boa família ou campanhas cívicas com o cata­vento auriverde -, paralelamente aos veiculados pe­lo Canal 100, que passou a ser uma revista de varie­dades, de entretenimento e de valorização da idéia de um Brasil poético. Pela primeira vez um cinejor­nal deixava a postura séria, apresentando temas va­riados de forma jovial, leve. A reação positiva dos espectadores às imagens do Cana 100 era facilitada pela noção de realidade do conteúdo jornalístico. 
Apesar de registrar cenas das grandes manifesta­ções estudantis, como a Passeata dos Cem Mil, em 1968, as telas mostravam algo diferente: lá estavam as realizações governamentais, a praia, as belas mu­lheres e, claro, depois do noticiário e das imagens da semana, o futebol, que finalizava cada edição com imagens surpreendentes. Futebol e música faziam parte de um único discurso e o público era tomado por imediata emoção ao ver a bola rolando na tela ao som de "Que bonito é..." ["Na cadência do sam­ba", de Luiz Bandeira], música composta em 1956 que se tornou tema do Canal 100.
A partir de 1970 a "paixão nacional" ganhou grande impulso no cinema, servindo para O' forta­lecimento do "Brasil Maravilha" promovido pelo governo Médici. As imagens do Canal 100 reforça­vam: "esse é um país que vai pra frente...". E en­quanto a TV ainda exibia os jogos em preto-e-­branco, a equipe de Niemeyer usava toda a sua téc­nica para trazer do México as primeiras imagens coloridas de uma Copa. Mas o início dos anos 80 trouxe grandes mudanças na realidade política, nos jornais cinematográficos e o fim da ditadura coin­cidiu com o do Canal 100, pois sem o auxílio eco­nômico das instituições governamentais não era mais possível manter um cinejornal em um mundo dominado pela televisão.


PAULO ROBERTO DE AZEVEDO MAlA é historiador, atualmente cursa o mestrado em Multimeios no Instituto de Arte da Unicamp e sua dissertação versa sobre o Canal 100.

CANAL 100 PELÉ E ZICO


CANAL 100 - BRASIL VS ALEMANHA.



Para saber mais:
BERNARDET. Jean­ Claude. Cinema brasileiro: propostas para uma história. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1976.
FICO, Carlos. Reinventando o otimismo: ditadura, propaganda e imaginário social no Brasil (1969-­1977). Rio de janeiro: Editora da FGV, 1997.
RAMOS, José Mário Ortiz. Cinema, Estado e lutas culturais. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983.
SIMIS, Anita. Estado e cinema no Brasil. São Paulo: Annablume, 1996.­
Mais informações e vídeos do Canal 100, www.youtube.com.br e  o  site próprio do  canal:  http://www.canal100.com.br/

Fonte:
AZEVEDO MAIA, Paulo Roberto de. “Que bonito é...” em Revista Nossa História. Ano 3. N° 33. Julho de 2006. P. 68-69.

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